domingo, 26 de setembro de 2010

wordpress

Marcando o início de um novo ciclo migrou este espaço para o domínio wordpress.

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

O Indivíduo

Mas, em boa verdade, somos mais altruístas do que egoístas. Mais nos interessa o alheio do que o próprio. Eis o erro.

Devemos, antes de tudo, amar a nossa pessoa individual, vendo já nela a sua descendência. O verdadeiro próximo somos nós. O outro próximo é uma ilusão, origem piedosa de muitos males.
Desprezo o mal que me causa [o vício], mas incomoda-me o prejuízo que ele faz ao meu vizinho. E nem sequer me lembro das vítimas futuras dos meus vícios!

Se todos os homens se tivessem amado a si próprios, em vez de terem amado os outros, creio bem que a Humanidade seria hoje mais feliz.

Teixeira de Pascoaes, Arte de Ser Português, 1920

quinta-feira, 8 de julho de 2010

afastado...

tenho andado afastado da escrita neste espaço.

talvez por acreditar que se tenha esgotado em si mesmo, substituido por outro qualquer espaço de tertúlia ou apenas porque a disponibilidade emocional para escrever algo mais do que ciência e afins não tenha sentido. talvez...
talvez agora que cinco ciclos se fecham possa renovar uma vez mais este íntimo. afinal escrever lava a alma e higiene nunca matou ninguém.

terça-feira, 30 de março de 2010

Marrocos I


Já demorei mais tempo em aeroportos europeus.

Passo pelo detector de metais, rolo pelas escadas, dou três passos e entro na gare de Casablanca. Que fluidez!
Partilho a carruagem com alguns turistas que entre cartas e conversa preenchem o tempo. De Casablanca a Marraqueche são quatro horas de comboio incluindo a mudança em Casa Voyageurs.

Recordo os comboios urbanos de Lisboa e os Regionais do Douro. A semelhança é estranha. Viajo com a minha asa o que me torna limitado no espaço. Ocupo dois lugares na carruagem. Um casal aproxima-se e com o olhar pergunta-me se pode ocupar um dos meus lugares. Cedo gentilmente e inicio uma longa viagem de ladex. Com a asa a ocupar metade do corredor passo grande parte do tempo a movimentá-la para que se possa circular no comboio.

Espanta-me o verde marroquino. Afinal aqui também chove. E se choveu este Inverno.

Avisto o Atlas nevado no horizonte. Tudo muda para vermelho. Estou a chegar a Marraqueche. A primeira e a última estrutura que se avista nestas cidades são os minaretes. Parece que o meu tem que ser sempre maior do que o teu!

Esta estação é extraordinária! Tudo imaculado. A monarquia sente-se. Taxi?! La shukran! Oh! Egypt! Julgo que me confundiram com algum turista egípcio. Mas felizmente foi o suficiente para afastar os quezilentos taxistas. Quero apenas deambular pela cidade enquanto espero pela minha boleia.

Percorro a Avenida Mohamed VI. Procuro um ciber-cafe onde possa informar os meus de que estou bem.
Com cautela livro-me das inúmeras MBK que como insectos voam por todo o lado. Perco-me na vida destes passeios. Têm de tudo. De simples mercearias a mecânicos itinerantes qual engraxadores de sapatos alfacinhas.

Chegámos a Aguergour. Estamos no acampamento base desta expedição. A cozinha de Chez Latifa é deliciosa. Tagine kefta para o jantar partilhada por um português, um inglês radicado, uma marroquina, um gaulês e um francês. O serão promete. O chá chegou e está deveras quente para mim.

Começou! Estou em Marrocos!

sábado, 20 de março de 2010

novamente para África...

Estou prestes a voltar à estrada. Ou melhor à terra batida africana.

Depois de vencida a ansiedade de como chegar à Marraqueche tudo começa agora a ganhar consistência e cor.

Já fui e voltei ao Magrebe mais de um dúzia de vezes nos últimos dias. Preparar a viagem é sempre mais árduo do que fazê-la.

Pisei pela primeira vez Marrocos em 2001. Recordo-me do cheiro nauseabundo do Porto de Casablanca e da ostentação da Mesquita Hassan II. Avistou-se de bem longe o Minarete, aliás conforme avisado pelo Navegador da Barca.

Lembro-me também de por inocente medo ter recusado viajar de comboio até Rabat. Fiquei pela Medina que em nada oferecia mais segurança. Enfim! Mas aos vinte anos falta sempre qualquer coisa e a mim faltou agir com o coração.

Anos mais tarde voltei para resgatar a honra e percorrer alguns quilómetros de comboio e mochila às costas. Ficou Chauoen pelo azul, Fés pelo cheiro das peles de gado a tingir e Meknes
pelo quarto dos fundos com azulejo verde até ao tecto.

Regresso agora para me encontrar com a Montanha. Voarei no Atlas se Eolo permitir e aterrarei no Toubkal se audácia e perícia mostrar.

Depois de aterrar em Casablanca viajo para Marraqueche de comboio. Espero no crepúsculo vespertino saborear o vento seco do deserto suspenso naquela que será a minha companheira de viagem. Que eu nunca lhe falte e que ela nunca se recuse a abrir.

(desta vez vou munido da Loperamida orodispersível. disso não me esqueçerei!)

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

After eight

‘After dinner, the weather being warm, we went into the garden and drank tea, under the shade of some apple trees… he told me, he was just in the same situation, as when formerly, the notion of gravitation came into his mind. It was occasion’d by the fall of an apple, as he sat in a contemplative mood. Why should that apple always descend perpendicularly to the ground, thought he to himself…’ William Stukeley

sábado, 16 de janeiro de 2010

Crónica de um Bairro Alto

Mal saio para a rua reparo num papagaio perdido cujo padrão colorido me traz à memória a manchete de um jornal lido ontem na banca da esquina. "Igreja abandona as Noivas de Santo António". Será o medo de casar aqueles que por estas travessas bairristas livremente demonstram o seu afecto?

Desço a Rua das Gáveas e viro na Travessa da Espera. Pergunto-me se não chove nesta cidade. Se tal acontecer onde se abrigam os veraneantes? Debaixo das varandas inexistentes?

Procuro fugir ao Fado e às cozinhas típicas portuguesas que apenas o são para turistas embriagados com a melancolia nostálgica da nossa cultura. Oiço pela janela de um restaurante italiano o sopro do Jazz. Cruzo-me com um Woody Allen português de óculos de massa e cigarro no canto do lábio. Sigo pela Travessa dos Fiéis de Deus onde sinto o peso de uma cultura judaico-cristã presente em quase todas as ombreiras de porta. Olho em frente e desaguo na Rua da Misericórdia. Guiado pelo Tejo pergunto ao Poeta qual o melhor local para me saciar entre lisboetas quotidianos. Sigo o seu olhar e dirijo-me para os Armazéns.

"-Passado o Carnaval acabou!" Apregoa o homem das castanhas que perfuma o ar de uma dessas esquinas.

Entre pombos que entretêm crianças na esplanada e estátuas que decoram fotografias cruzo-me com um casal chino recentemente assediado por um Relações Públicas de um restaurante de arcada. Seguimos juntos na calçada até à porta dos agora cosmopolitas Armazéns do Chiado.

Desço ao esgoto da cidade. Haverá sempre espera na toilette feminina. Recordo o preço que paguei para satisfazer a base de Maslow, protegido do vento gélido berlinense faz precisamente um ano. Emergo à restauração. Ao fundo a Universal Hamburgueria. Igual a si própria. Factor de escala perfeito para melhor compreender a projecção no Mundo do Mundo de cada cultura e povo. Cruzo o olhar com um corpulento homem, que há minha frente degusta o poder refrescante do amrit americano. Isolado na sua esfera i-pódica partilha comigo a solitária refeição, dissolvidos entre colunas, onde "Prevenir está nas suas mãos" e ao alcance de uma gota de desinfectante viral.

O creme de cenoura tem um tempero especial. Talvez por ser das poucas fugas possíveis, a uma gastronomia predominantemente carnívora, que um comensal vegetariano pode seguir.